Este mês foi com algum receio que fui assistir às micro-peças do Teatro Rápido. A razão não tinha nada a ver com o tema escolhido para Junho, É PARA AMANHÃ (título de uma famosa canção de António Variações), mas sim pelo facto das sinopses das peças me terem deixado com a sensação que Ia ser um mês demasiado sério e intelectual para o meu gosto. Felizmente, os meus medos eram praticamente infundados e acabei por aprender três coisas: que a palavra (perdoem-me o seu uso) cona é excelente para quebrar silêncios, que Deus é quadrado e que, para chamarmos a atenção, em vez de andarmos devemos deslizar.
Que a Europa nos andar a lixar a todos não é novidade e em VOU DAR LUTA, na Sala 1, essa situação é representada literalmente. Um jovem em desgraça (Portugal) é amante de uma mulher mais velha e ambiciosa (Europa), entre os dois há erotismo e troca de palavras, mas pouco mais. O texto de Luís Mário Lopes não trás nada de novo ao assunto, arrastando-se numa série de lugares comuns sem grande interesse. Após uns longos segundos de silêncio, os actores Vítor Oliveira e Custódia Gallego fazem o melhor que podem com o texto que lhe deram; ele, com um brilho constante nos olhos, parece estar a adorar todos os segundos, ela torna a sua Europa uma mulher forte e sem remorsos.
Na Sala 2 espera-nos uma novidade. Em vez de uma peça de 15 minutos, temos 3 peças de 5 minutos. São elas A CAMISA, O VESTIDO E A JANELA, todas a partir de “Peças Amorosas” de André Murraças e todas interpretados pelo jovem Eduardo Molina, que é desde já uma das maiores revelações na história do TR. Não sei o que este actor fez antes, mas tenho a certeza que quero saber o que ele vai fazer a seguir. Com um perfeito “comic timming” e uma simpatia natural que facilmente conquista o público, ela conta-nos tudo sobre os buracos na sua camisa, da importância que um vestido branco tem para uma bailarina e revela um voyeurismo inquietante sobre tudo o que vê a partir da sua janela. O melhor momento é o da bailarina, que é verdadeiramente hilariante; mas tudo o resto é pleno de graça e tinha ficado de bom grado mais tempo na companhia de Molina a ouvi-lo contar mais histórias. Com uma cenografia simples e uma direcção sem falhas, é a melhor peça deste mês e uma das melhores na história do TR. Imperdível!
Um casal praticamente incapaz de comunicar entre si, em que o marido é especialista em deixar tudo para amanhã e a mulher é uma “bemzoca” que não faz nenhum, é o tema de AMANHÃ. Esta divertida peça da autoria de Frederico Pombares e Joana Gama, com uns diálogos muito bem conseguidos, de humor corrosivo e próximos da realidade, foi para mim uma agradável surpresa. A dar vida aos protagonistas temos dois convincentes actores, André Nunes e Vânia Maria. Ele é um irritante e arrogante menino rico, ela uma menina provinciana que virou fina. Juntos, Nunes e Maria, tornam as personagens reais, conseguindo ultrapassar a caricatura em que se podiam ter tornado. Uma boa e conseguida aposta em exibição na Sala 3 do TR.
Quem já me conhece, sabe que não sou muito dado a “contemporanices”, ou seja, tenho gostos convencionais e gosto muito de perceber o que estou a ver. O que me deixa numa situação difícil perante JBWB-900, a peça em exibição na Sala 4. Gostei do lado visual da mesma e achei que havia imensa química entre os actores João de Brito e Wagner Borges, mas não percebi a história, se é que havia alguma. Houve alturas em que eles me fizeram lembrar duplas cinematográficas como, em ofensa, o Bucha e Estica; o humor físico da peça fez-me lembrar esses filmes. Quanto à “história”, bem eles tanto podem ser estranhos, amigos ou mesmo amantes... ou talvez nada disso. Desculpem, gostei dos actores, mas não percebi o assunto. Foi aqui que aprendi que “Deus é quadrado”.
Ao contrário do que o tema do mês apregoa, não deixem para amanhã e vão a correr ao TR ver o programa do mês. Há apostas para todos os gostos e o grupo de actores que dão vida a todas as peças é todo ele talentoso. Pessoalmente recomendo os divertidos AMANHÃ e A CAMISA, O VESTIDO E A JANELA; esta última é já uma das minhas preferidas de todos os tempos e a interpretação de Eduardo Molina, que eu não conhecia de lado nenhum, foi uma agradável surpresa. Para Julho há mais, ou assim espero.
Fotos © Mário Pires - www.ruadebaixo.com
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