Numa estação de camionetas, duas estranhas passam a noite num banco enquanto esperam pelas primeiras carreiras da manhã. Uma é uma mulher do povo, a outra uma ricalhaça; ambas encontram-se ali por razões pessoais e, sem se conhecerem de lado nenhum, acabam por desabafar uma com a outra. Ambas são assombradas pelos seus passados e enfrentam um futuro imprevisível.
O autor e encenador desta peça é João Ascenso, um excelente dramaturgo que estou certo que um dia vai ter o reconhecimento que merece. Este talentoso jovem, cujo trabalho tive o prazer de descobrir no Teatro Rápido, tem o dom de conseguir criar situações e personagens reais com uma linguagem simples, despretensiosa, pontuada com um apurado sentido de humor e esta sua nova peça não é excepção. É quase impossível não sentir empatia com as personagens e não nos deixarmos levar pelas suas emoções; tão depressa estamos a rir, como a seguir estamos com um nó na garganta.
Enquanto encenador, Ascenso sabe que o que importa são as personagens e a história, tudo o resto é praticamente supérfluo. Nesta peça, o cenário cinge-se a um mero banco onde as personagens se sentam; o resto da estação existe apenas no mundo da imaginação e ele consegue fazer-nos acreditar que está lá tudo. Como se diz em inglês “less is more” e neste caso serve na perfeição a história.
Claro que para uma peça deste género funcionar é necessário a presença de boas actrizes e também aí Ascenso não falhou. No papel da mulher do povo, Sofia Nicholson é fantástica, dando-nos uma interpretação expressiva, emocional e cheia de graça. No papel da ricalhaça, Alexandra Sargento pode ser por vezes um pouco overacting, mas é convincente como a “benzoca” distante que acaba por se tornar uma mulher mais humana e é excelente nessa transformação. Percebe-se que ambas se entregaram sem reservas a este projecto e juntas conquistam o nosso coração. No final foram aplaudidas em pé por uma plateia rendida ao seu talento e às palavras simples e brilhantes de João Ascenso.
Um grande momento de teatro a não perder! Classificação: 9 (de 1 a 10) / cartaz de Luís Covas e fotos de Pedro Sadio
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