terça-feira, 22 de julho de 2025

REPARATIONS BABY! de Marco Mendonça

Aviso: este comentário poderá ser politicamente incorrecto.

É a estreia de um novo concurso televisivo na televisão portuguesa. O que o distingue de todos os outros é que, numa tentativa de ser um programa mais inclusivo, os concorrentes são todos de etnia negra. A ajudar à festa a apresentadora é de ascendência asiática. Que comece o concurso com as suas perguntas e os seus prémios.

Esta é a premissa desta peça da autoria de Marco Mendonça. Sempre acreditei que a rir é a melhor forma de falar de assuntos sérios e é isso que acontece aqui. Sim, por vezes sentimo-nos incomodados com o humor racista, mas mesmo assim rimos e não acredito que isso faça de nós piores pessoas. O assunto é sério e infelizmente cada vez mais actual. Na verdade, independentemente da nossa etnia, somos todos um pouco racistas.

A acção flui com ritmo e humor por cerca de duas horas e, se bem que não havia necessidade de ser tão longa, nunca é chata. Sem querer revelar muito, acho que a peça teria muito mais impacto se terminasse quase logo a seguir ao último jogo, quando as coisas se tornam mais sérias e mesmo negras (aqui o termo não tem conotação étnica). Esse jogo final é forte, real e um murro no estômago, mas o que vem a seguir é um bocado didático, um pouco moralista. Compreendo a ideia do autor/encenador, mas por mim terminava com o resultado desse jogo… mentira, acho que logo a seguir a Diva, com a sua santa ignorância, devia fazer uma entrada triunfal. Mas isto é só a minha opinião e gostei do que vi.

O elenco é todo ele muito bom. Já tinha tido o privilégio de ver Ana Tang, Stela, June João e Bernardo de Lacerda no recente A FARSA DE INÊS PEREIRA; mais uma vez estão todos muito bem e é bom perceber a cumplicidade que partilham em palco. Por razões óbvias, Tang destaca-se como a apresentadora sempre sorridente (as Cristinas Ferreiras deste mundo que se ponham a pau), e Stela como a divertida Diva. Como os concorrentes, Vera Cruz (que tive a sorte de ver em A MÉDICA), Danilo da Matta e Márcia Mendonça dão, com talento, voz à sua minoria étnica, num misto de aceitação/revolta perante os acontecimentos a que são submetidos, incluindo o próprio teor das perguntas do concurso.

Quando a peça terminou, fui jantar com o grupo de amigos com os quais assisti à peça. Foi curioso como as opiniões se dividiram e, acima de tudo, de como a peça nos fez debater assuntos de que não costumamos falar. Só por isso já vale a pena assistirem à peça, mas há mais razões para o fazerem: as gargalhadas são boas, o elenco merece o vosso aplauso e duvido que fiquem indiferentes ao que se passa em palco.

Elenco: Ana Tang, Bernardo de Lacerda, Danilo a Matta, June João, Márcia Mendonça, Stela, Vera Cruz

Equipa Criativa - Texto: Marco Mendonça • Encenação: Marco Mendonça • Cenografia: Pedro Azevedo • Figurinos: Aldina Jesus, Pedro Azevedo • Desenho de Luz: Teresa Antunes • Desenho de Som, Sonoplastia e Música Original: Mestre André • Video: Heverton Harieno • Apoio à Criação: Bruno Huca • Cláudio Castro, David Esteves, José Neves, Pedro Gil • Produção: Teatro Nacional D. Maria II

Fotos: Filipe Ferreira



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